1. Sustentabilidade é um conceito sistêmico; relacionado com a continuidade dos aspectos econômicos, sociais, culturais e ambientais da sociedade humana. Mas o que isso tudo pode significar na prática?
Na prática significa o procurar um sistema autossustentável que não seja autodestrutivo. Por exemplo, o consumo, nos padrões atuais, de combustíveis fósseis, produz um nível de poluição responsável pelas introdução de alterações climáticas que irão tornar, a seu tempo, o planeta Terra inabitável. Ou, por exemplo, a produção de lixo não biodegradável e poluente -- como é o caso dos plásticos --, com consequências negativas ao nível da biodiversidade, pondo em causa a sobrevivência de espécies vegetais e animais e, em última instância, do próprio Homem. Sustentabilidade significa, a nível sistêmico, o se procurar um sistema estável e não autodestrutivo, usando recursos que não se esgotam -- como a energia solar ou a eólica, inclusive com a estocagem de vento (sim, esta existe; cf., entre outros, <"http://agencia.fapesp.br/reino_unido_vai_usar_ar_liquido_para_estocar_energia/19210/">) --, ou que são autorrenováveis, não se esgotando se consumidos até à sua capacidade de autorregeneração.
2. A responsabilidade social e a sustentabilidade devem permear as decisões do novo líder organizacional. Em tempos de consumo excessivo e escassez de recursos naturais, qual o grande desafio do gestor?
O de conseguir reduzir o consumo de recursos naturais a níveis que estejam dentro da sua autorregeneração ou o de promover a pesquisa de alternativas viáveis em tempo útil. Ou seja, promovendo um consumo responsável dos recursos naturais existentes ao mesmo tempo que investe em ciência na procura atempada de alternativas viáveis a estes.
3. Quais os parâmetros que deverão ser observados para formação, desenvolvimento e aperfeiçoamento de gestores – líderes, diante desta nova economia, compartilhada e criativa? Cidades Criativas são uma realidade prática ou ainda mera utopia? Opine.
Penso que é preciso ter algum cuidado na relação entre a abstração do discurso e das ideias, e a realidade concreta e vivida. Como seres humanos, somos dotados de uma capacidade de abstração única entre os seres vivos que habitam este planeta Terra, sendo capazes de operar logica e racionalmente sobre símbolos abstratos que representam um mundo real. Essa é a essência da linguagem, sobretudo da matemática. Mas esta capacidade de abstração é um perigo quando a mesma se distancia da efetiva realidade. E isso é algo comum de acontecer a diversos níveis, incluindo na ciência.
Por vezes, quando leio sobre novos paradigmas emergentes, como é o caso da ideia em torno da economia partilhada -- ideia que ressurge na contemporaneidade como consequência direta da oposição entre o desenvolvimento de software em código aberto e o desenvolvimento de software em código fechado, dicotomia que começa a ganhar relevância nos finais da década de 1970 e princípios da década de 1980, opondo as visões comerciais de um Bill Gates ou de um Steve Jobs, a uma visão de desenvolvimento colaborativo de Richard Stallman, fundador da Free Software Foundation e promotor do GNU/Linux --, vejo-os sobretudo como um nicho que, podendo promover reais impactos ao nível da mudança global, dificilmente se irão impor na sua «pureza» como modelos dominantes na nossa sociedade marcada por ideários profundamente egoístas e totalitários. Aliás, a essência do tipo de capitalismo em que nós vivemos se centra na ideia de individualismo, algo que é incompatível com a ideia generalizada de partilha de algum comum a todos nós. Basta ver os ódios que pululam na internet, aqui no Brasil, ao dito «comunismo», o qual em si nada mais é do que a ideia de comunhão e partilha de bens e serviços entre os indivíduos que compõem toda uma sociedade. E esta irracionalidade é tal que, por exemplo, nos Estados Unidos chegou a motivar processos judiciais contra as ideias de Richard Stallman e do Open Source Software -- no Brasil traduzido de forma que não é, do ponto vista conceptual, totalmente correta por Software Livre --, apelidando-as de comunistas.
Também algumas destas visões tendem, na minha perspetiva, a endeusar a tecnologia, algo frequente em quem na verdade não a conhece por dentro, olhando-a como algo de mágico. E isso é comum em algumas correntes de pensamento tidas por autores que, vindo das ciências sociais, não possuem real contacto com o saber fazer ("know how") tecnológico. Por isso, tenho sempre alguma renitência com tais discursos que, não partindo de um real saber fazer tecnológico -- nunca tiveram, por exemplo, real experiência no desenvolvimento de «hardware» ou de «sofware» --, olham para a tecnologia como sendo uma espécie de Santo Gral que na verdade não é.
Devo dizer que esta minha visão, algo cética, vem sobretudo do fato de, apesar de essa não ser a minha área de formação acadêmica e profissional, desde muito cedo tive contato direto com a tecnologia ao nível da eletrônica e da informática por razões familiares. O meu primeiro computador, em 1982, foi um ZX81 (cf. <"https://en.wikipedia.org/wiki/ZX81">) e, um pouco mais tarde, o meu segundo computador foi um Jupiter Ace (cf. <"https://en.wikipedia.org/wiki/Jupiter_Ace">). Enquanto aluno do ensino médio, durante a primeira metade da década de 1980, trabalhei com um sistema de Time Sharing com terminais de teletipo e baseado num computador da General Electric da primeira metade da década de 1960, o Mark I (cf. <"http://piano.dsi.uminho.pt/museuv/1960gemark1.html">), tendo tido alguma prática de programação, sobretudo em BASIC, COBOL e FORTH, tecnologias hoje algo ultrapassadas. Isso fez com que possua uma visão por dentro do que este tipo de tecnologias é efetivamente capaz de fazer, e a forma como as mesmas conseguem ser absorvidas pela sociedade em algo que tenha real significado e aplicação prática. Desta forma, sendo defensor do uso da tecnologia na procura de melhores soluções para os problemas do nosso quotidiano, sou também profundo conhecedor dos riscos e limitações das mesmas. Por exemplo, tem havido uma procura muito grande na desmaterialização e digitalização de processos na área administrativa -- normalmente associado a uma ideia subjacente de redução de custos --, mas sem a existência de um real conhecimento dos riscos e dos problemas que esse tipo de soluções acarreta, desde a dependência criada pela escolha de soluções proprietárias -- as quais um dia se arriscam a deixar os usuários com dados arquivados mas inacessíveis, ao mesmo tempo que ficam extremamente vulneráveis a políticas comerciais agressivas que retiram as reais vantagens econômicas pensadas a quando da adoção de tais soluções tecnológicas --, até aos reais riscos de perda de informação, passando pelas dificuldades de muitos usuários na sua adaptação ao uso das referidas tecnologias, impondo um longo tempo de aprendizagem. Penso, pois, que tem de haver um equilíbrio bem ponderado no seu uso, sem quaisquer deslumbramentos, como se a tecnologia abrisse de repente um mundo mágico onde todos os nossos problemas deixassem de existir. Isso simplesmente não é o que verdadeiramente acontece, nos esperando consideráveis dores de cabeça, nomeadamente a quando do início da adoção de tais tecnologias. Dito isto, defendo o seu uso. Mas um uso consciente e sem os deslumbramentos que por vezes vejo associado em alguns discursos que, na verdade, são um «remake» do the brave new world de Aldous Huxley, numa referência a um clássico da literatura norte americana da primeira metade (1932) do século passado. Este penso ser o grande risco em torno de tais discursos que levem a adoções precipitadas de soluções tecnológicas ainda não devidamente maduras e maturadas.